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2014-02-10 11:05

2014-02-10 11:05

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Tornado ocorrido no concelho de Paredes a 04 de janeiro de 2014

No dia 4 de janeiro último, o estado do tempo em Portugal Continental foi condicionado pela presença de um anticiclone centrado sobre a região do arquipélago da Madeira e por uma depressão muito cavada centrada a oeste das Ilhas Britânicas. Uma corrente de jato com orientação geral noroeste-sudeste, situada a oés-noroeste de Portugal Continental, forçava a existência de divergência em altitude e consequente reforço dos movimentos ascendentes, na região litoral norte. Em ar pós-frontal frio, com intrusão de ar mais seco de proveniência estratosférica, valores elevados da CAPE e com uma rotação do vento no sentido horário em altitude (com intensificação do vento), o denominado veering, estiveram reunidas algumas condições para suporte de conveção organizada.

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Figura 01 – Imagem do Meteosat Second Generation (MSG), no canal do IR, das 0000 UTC de dia 04 de janeiro de 2014 (ePort, EUMeTrain)

Às 0000UTC, a região litoral norte de Portugal Continental, estava a deixar de ser afetada pela superfície frontal fria (ver figura 01) e, verifica-se que o tempo severo teve a sua génese em ar pós-frontal, com intrusão de ar mais seco estratosférico na troposfera, na vizinhança da corrente de jato (ver figuras 02.a) e b)).

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Figura 02.a)                                                                                                                                            Figura 02.b)

Figura 02 – a) Imagem do Meteosat Second Generation (MSG) no canal WV6.2, de dia 04 de janeiro de 2014 às 0000UTC (ePort, EUMeTrain); b) idem com a sobreposição das isolinhas que representam a altura em hPa onde a vorticidade potencial é igual a 1.5 PVU.

NOTA: As estruturas convectivas analisadas nas imagens radar, encontram-se a uma distância, à estação radar, superior a 200km, o que teoricamente, e considerando a elevação mais baixa (0°) do feixe através de uma propagação normal, situam-se no mínimo a 2 km de altitude (interpretação radar).

Pelas 0020 UTC, as observações com o radar Doppler de Coruche/Cruz do Leão (C/CL) identificam, no azimute 300° e 315° a cerca de 275 km de distância em relação ao radar C/CL, a presença de dois máximos relativos de refletividade, com expressão significativa em altitude, a oeste da região de Aveiro com deslocamento no sentido sudoeste-nordeste. (ver figura 03 – produto maxz).

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Figura 03 – Imagem das 0020 UTC de 04 de janeiro de 2014 do produto MAXZ, em dBZ, do radar C/CL

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É importante referir que, a região em análise encontra-se fora do alcance de desempenho de produtos de aviso de supercélula (SC) e de supercélula tornadogénica (SC_T), pois são produtos que só podem ser emitidos até um alcance de 100 km em torno de cada estação radar (intervalo [10, 90] km) (figura 04).

 

 

 

 

 

Figura 04 – Limites para o alcance de desempenho dos produtos de aviso SC e SC_T para ambos os radares


Os testemunhos relatados através da plataforma MetoGlobal, de queda de granizo e/ou saraiva em Matosinhos (0230 – 0245 UTC), na Maia (0245 UTC), em Valongo (0250 UTC), em Leça da Palmeira (0300 UTC), e os danos provocados no concelho de Paredes, são consistentes com o percurso realizado pela estrutura convectiva que posteriormente viria a dar origem ao tornado (figura 05).

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Figura 05 – Imagem do Google Earth com indicação dos relatos de granizo (MeteoGlobal) e com a marcação do trajeto do tornado no concelho de Paredes (freguesias de Lordelo, Vilela e Duas Igrejas)

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Figura 06 – Zoom in da zona do trajeto, assinalada na figura 05, com indicação das freguesias afetadas pela passagem do tornado (Google Earth)

Embora se tenham considerado as estruturas identificadas na figura 03 como estruturas convectivas do tipo supercelular (SC), a inexistência de observação de velocidade Doppler à distância a que se encontravam da estação radar não permitiu efetuar a identificação do característico mesociclone. A classificação foi, por isso, efetuada com base na sua longevidade, critério sugestivo de elevada organização convectiva. Neste contexto, verificou-se que diversas características morfológicas da estrutura convetiva obedeceram ao modelo conceptual de supercélula.

Por volta da 0050 UTC é identificável uma terceira SC (SC3) (figura 7.a)). Por volta das 0250Z, a SC1 entra em terra a norte do Porto, mais concretamente na região de Matosinhos, enquanto a SC2 depois de atingir a sua fase de maturação dissipa-se ainda sobre o mar (figura 7.b) círculo vermelho a tracejado)). A SC3 atingirá mais tarde a costa portuguesa.

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Figura 7.a) Imagem do produto MAXZ, em dBZ,do radar C/CL, das 0050 UTC de 04 de janeiro de 2014

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Figura 7.b) Imagem do produto MAXZ, em dBZ,do radar C/CL, das 0250 UTC de 04 de janeiro de 2014

Através das imagens de radar, pode-se concluir que a SC1 teve, no mínimo, um tempo de vida de 3 horas e que, entre as 0300 UTC e as 0315 UTC, afetou o concelho de Paredes (figura 08).

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Figura 08 – Imagem das 0310 UTC de 04 de janeiro de 2014 do produto MAXZ, em dBZ, do radar C/CL

Recorrendo às imagens de radares meteorológicos localizados em Espanha, nomeadamente o radar da Corunha (AEMET) e o radar da Galiza (Meteogalicia), pode analisar-se:

  • uma imagem do produto PPI(Z) (observação radar de Meteogalicia), embora tenha deixado de funcionar após as 0215 UTC (figura 09);
  • uma imagem do produto Echo Top (observação radar AEMet), onde é visível a extensão vertical da SC (aproximadamente 10 km) após já ter passado sobre a área onde ocorreu a maior parte dos danos materiais (figura 10);

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Figura 09 – Imagem do produto PPI(Z), das 0215 UTC de 04 de janeiro de 2014, em dBZ, do radar da Meteogalicia

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Figura 10 – Imagem do produto Echo Top, das 0320 UTC de 04 de janeiro de 2014, em km, do radar da Corunha (AEMet)

Consideração final:

A natureza dos danos que foi possível apurar por via documental (fotos, relatos), sugere ter-se tratado de um tornado F1/T3. Recorda-se que F designa a escala de Fujita clássica e T a escala de TORRO.

 

Danos materiais no concelho de Paredes e comentários sobre o evento:

  • Vídeo dos danos materiais no concelho de Paredes;
  • telhados que ficaram sem parte ou a totalidade das telhas;
  • armazéns, fábricas e um pavilhão desportivo em que as chapas do telhado (zinco e painel sandwich) foram arrancadas e levadas para mais de 100 metros do local;
  • um poste de alta tensão vergado/torcido;
  • painéis/folhas de zinco dobrados e entrelaçados nos cabos e postes elétricos a 20 metros de altura;
  • postes de cimento da EDP e postes de madeira da PT partidos;
  • janelas e caixilharias de alumínio arrancadas, bem como as persianas de PVC e de alumínio;
  • árvores de grande porte (pinheiros, sobreiros e eucaliptos) tombados pela raiz e algumas partidas no seu tronco;
  • 1 eucalipto centenário tombado;
  • uma câmara frigorífica por cima de um muro de 1 metro de altura e a vários metros de distância;
  • um dos populares na freguesia de Vilela afirmou que o barulho (pouco após as 3h da manhã) parecia o de um comboio/avião;
  • o diâmetro aparente dos estragos ao longo dos vários quilómetros onde se registaram ocorrências andará em torno dos 200 metros, exceto na freguesia de Sobrosa onde aparentou ter entre 50 e 100 metros, na parte onde terá terminado;
  • em Lordelo, numa zona de um ribeiro, destroços espalhados ao longo do trajeto, com bastantes telhados danificados, coletores solares arremessados a cerca de 10/15 metros do local, bem como portas e janelas/persianas partidos;
  • a cerca de 1,5 km, junto à escola C+S de Vilela, um poste de alta tensão dobrado, com folhas do telhado do pavilhão da escola a cerca de 20 metros de altura nos fios elétricos (e outros a mais de 150 metros de distância espalhados). Num raio de 200 metros casas com telhados danificados;
  • a cerca de 500 metros, em Vilela, num pequeno vale, casas completamente sem telhado, postes de cimento e de madeira partidos pela base ou a menos de 2 metros de altura, estruturas como pombais arremessados a mais de 10 metros e outro a mais de 50 metros de distância;
  • danos consideráveis ainda em Vilela, com um eucalipto de grande porte (cerca de 70 cm de diâmetro) partido a cerca de 3 metros de altura, outros tombados, como outras árvores fruteiras;
  • Os prejuízos provocados pelo tornado da madrugada de sábado, em Paredes, ascendem a 5,5 milhões de euros, adiantou hoje à Lusa fonte da proteção civil municipal. Os dados são ainda preliminares e resultam do levantamento que os serviços da autarquia de Paredes e da proteção civil estão a realizar no terreno. O presidente da câmara, Celso Ferreira, reuniu-se esta manhã com os vereadores da sua equipa para preparar a reunião do executivo de hoje à tarde, na qual se prevê que possam ser aprovadas as primeiras medidas de apoio às cerca de 60 pessoas desalojadas.

 

(fonte: Vidyouline e vimeo)

(fonte: Fórum MeteoPT > Provável tornado em Paredes – 4 de janeiro de 2014)

(fonte:http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3617164&seccao=Norte&utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook)